O legado de Nosferatu: um clássico pelos olhos de Robert Eggers
- Júlia Carla
- 15 de jan.
- 4 min de leitura
Não tem como pensar em clássicos do terror e no cinema gótico sem lembrar de Nosferatu, e Robert Eggers nos apresenta um novo olhar sobre um dos vampiros mais icônicos da história do cinema em seu mais recente sucesso.
Nosferatu (2024) é uma nova versão de um clássico do cinema mudo, Nosferatu, eine Symphonie des Grauens (1922), de F.W. Murnau, que, por sua vez, é uma adaptação não autorizada de Drácula (1897), de Bram Stoker.
O longa se passa na Alemanha do século XIX e conta a história do jovem casal Thomas Hutter (Nicholas Hoult) e Ellen Hutter (Lily-Rose Depp). Na trama, Thomas viaja a trabalho para encontrar e negociar com o misterioso Conde Orlok (Bill Skarsgård), que busca um novo lar. Enquanto isso, Ellen, que aguarda ansiosamente o retorno do marido, é atormentada por pesadelos e visões sombrias.

A relação entre Ellen, Thomas e Orlok ganha aqui uma outra proporção, que exala uma estranha sensualidade. O desejo mais profundo de uma mulher que, apesar de amar o marido, procura alguém capaz de compreender sua escuridão, e a obsessão de uma criatura por uma jovem que o clamava. "Ela está dividida entre um marido bom, estável, benevolente e amoroso, e algo que é muito poderoso, muito destrutivo, mas também muito sedutor para ela, e você a vê sendo dilacerada entre essas duas forças", disse Bill Skarsgård em entrevista à revista Fangoria.
Eggers reimaginou essa obra cinematográfica e nos trouxe um Nosferatu com características e estética que somente o diretor conseguiria executar. O cineasta tem uma maneira de dirigir muito própria e consegue deixar a sua marca na obra, da mesma forma que faz em outras produções assinadas por ele, como O Farol (2019) e A Bruxa (2015). É notório o cuidado em cada elemento, como a composição dos cenários e figurinos, fiéis ao período retratado; neste caso, a Alemanha de 1838. Além disso, o diretor se empenha em trazer diversos aspectos ligados ao folclore europeu e utiliza luz e sombra com muita destreza, criando cenas que expressam e intensificam o drama que se estende na narrativa.
Nesta versão de Nosferatu, o roteiro de Eggers dá maior destaque a Ellen Hutter em comparação ao filme de 1922, permitindo ao público explorar mais a fundo as aflições da personagem. Por mais que o trabalho anterior de Lily-Rose Depp na decepcionante série The Idol (2022) tenha sido alvo de críticas negativas e sua atuação tenha deixado muito a desejar, em Nosferatu, Depp conseguiu demonstrar potencial como atriz e entregar um bom desempenho.
A escalação de Bill Skarsgård para o papel de Conde Orlok foi certeira. A caracterização do ator para dar vida ao vampiro impressiona, a ponto de se tornar quase irreconhecível por trás das próteses e das roupas. Além disso, Skarsgård, que já havia brilhado em outro papel do horror, vivendo o palhaço Pennywise em It: A Coisa (2017), deu ao Conde Orlok um atributo que marcou o filme desde a primeira aparição do personagem: uma voz aterrorizante.
O elenco é estrelado por outros grandes nomes, como Nicholas Hoult, Aaron Taylor-Johnson e Emma Corrin. No entanto, Willem Dafoe, que já colaborou com Eggers em O Farol (2019) e O Homem do Norte (2022), rouba a cena como o Prof. Albin Eberhart. Apesar de ser um personagem coadjuvante, ele desempenha um papel crucial para o desenrolar e a compreensão da história.
Como dito anteriormente, Robert Eggers tem uma maneira muito única e memorável de dirigir. Embora Nosferatu seja um filme bem executado e com boas atuações, lhe falta a estranheza e a originalidade que caracterizam outros trabalhos de Eggers, como A Bruxa (2015) e o já citado, O Farol (2019).
Apesar de Eggers trazer o ponto de vista da protagonista feminina e sua conexão com a criatura como um elemento novo, em alguns momentos falta aprofundamento e desenvolvimento nos temas e diante dos dramas que o cineasta introduz ao longo da trama. Outro ponto é o gerenciamento do tempo: enquanto alguns acontecimentos, como a jornada de Thomas, são bem explorados, outros, como a relação entre o Conde Orlok e seu subordinado, Knock — ou os eventos dentro do navio que o transportava — são abordados de forma breve e superficial.
Criar uma versão reimaginada do clássico Nosferatu era um desejo antigo do diretor. Esse desejo causou no público que acompanha sua carreira um interesse em ver uma versão diferente da história. Entretanto, apesar de ser um tributo bonito ao legado do personagem, o diretor nos entregou mais do mesmo: não houve risco real de erro e não tiveram muitos aspectos que se destacassem das versões de Murnau e Herzog.
Nosferatu é um conto gótico que atravessou gerações e ainda causa grande comoção ao ser lembrado. Aqui, Eggers nos entrega a obsessão, sedução e o profano que apenas encontramos no vampirismo de sua versão de um clássico. Nosferatu (2024) estreou nos cinemas nacionais no dia 2 de janeiro de 2025 e segue disponível nos cinemas por todo o país.
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